Estudantes da 2ª série do Ensino Médio aprofundam o estudo sobre o impacto de atividades econômicas e do uso de agrotóxicos em regiões do interior do Estado de São Paulo; projeto foi desenvolvido ao longo do segundo semestre utilizando conhecimentos de Biologia e Química

Autoria: Marcos Iki – Professor de Filosofia

No Ensino Médio do Colégio Santa Maria temos buscado, de forma deliberada, promover diálogos interdisciplinares. Nem sempre isto é factível, dados os diferentes objetos de estudo e métodos científicos, bem como a existência de uma história social de compartimentação das formas de conhecimento. Então, como podemos estimular essas trocas?

Olhar para as problemáticas da contemporaneidade reafirma a necessidade do diálogo entre os diversos campos do saber.  Cotidianamente, as notícias trazem questões que embaralham as particularidades da Ciência, da Política e da Filosofia. Compreender, por exemplo, o risco e os impactos de países submergindo em virtude do aquecimento global demanda diversos saberes, tanto das dinâmicas dos gases de efeito estufa quanto do direito dos povos ao seu território, passando pelas alterações de ecossistemas e por acordos geopolíticos de mitigação de danos.

Estamos cada vez mais imersos nesta imensa rede de agentes e interesses, que inclui a mobilização da natureza em sentidos econômicos e políticos. Filósofos contemporâneos, como Bruno Latour, desenvolvem reflexões muito instigantes e necessárias a respeito desta dimensão da vida na modernidade, oferecendo subsídios para sua crítica; as alunas e os alunos da 2ª série contaram com algumas de suas contribuições para desenvolver o trabalho que descrevo a seguir.

Da teoria para a prática

Ao longo do segundo semestre, buscamos exercitar uma reflexão a partir de estudos de caso. Tivemos como alicerce um projeto desenvolvido pelas unidades curriculares de Química e Biologia, que pesquisou os impactos de atividades econômicas e da utilização de agrotóxicos em regiões do interior do Estado de São Paulo para os ecossistemas e a comunidade do seu entorno. Fenômenos bio-físico-químicos foram estudados e propostas de soluções, desenvolvidas pelos grupos. Em um segundo momento, mobilizamos conceitos e perspectivas das Ciências Humanas para promover uma contextualização ainda mais detalhada destas ações. A pesquisa sobre a legislação relacionada ao tema, das relações de produção envolvidas, dos espaços de deliberação acerca do uso das substâncias estudadas, instigou estudantes a desenvolver um olhar curioso, atento à complexidade do tema estudado.

Não foi uma atividade simples, tanto para os docentes envolvidos quanto para os grupos de alunas e alunos. Nós, professores, tivemos de partir das especificidades de cada componente curricular, mantendo o rigor e os conceitos que lhe são próprios, e caminhar em direção a um sentido comum para o trabalho. As turmas tiveram de promover pontes entre elementos que, a princípio, lhes pareciam muito díspares. Apesar das dificuldades, o resultado que pudemos ver até aqui foi bem satisfatório: dados bastante reveladores foram levantados, conceitos mobilizados com precisão e reflexões desenvolvidas com embasamento teórico.

Se o século XXI demanda que olhemos para a complexidade de seus fenômenos com ferramentas de diversos campos do conhecimento, é fundamental que se promova o exercício desse olhar. E a escola, como um espaço privilegiado para o pensamento, deve também buscar contribuir para que tenhamos elementos para este enfrentamento.

Encerro este texto com um pequeno trecho da Encíclica Papal Laudato Si´, de 2015, em que o Papa Francisco apresenta reflexões muito alinhadas à perspectiva que buscamos desenvolver nesta atividade.

“Dada a amplitude das mudanças, já não é possível encontrar uma resposta específica e independente para cada parte do problema. É fundamental buscar soluções integrais que considerem as interações dos sistemas naturais, entre si, e com os sistemas sociais. Não há duas crises separadas: uma ambiental e outra social; mas uma única e complexa crise socioambiental. As diretrizes para a solução requerem uma abordagem integral para combater a pobreza, devolver a dignidade aos excluídos e, simultaneamente, cuidar da natureza”.

Barco anteriormente submerso aparece no leito do lago Mead, na América do Norte.
Fonte: Al Jazeera.com. Mario Tama/Getty Images