Um olhar sensível para o momento que a escola e as crianças estão “vivendo juntas” . Este texto poético da professora Beatriz Gomes, do Jardim I, é uma expressão do que significa a relação de uma educadora das infâncias com cada criança, na primeira fase do ano escolar. Enjoy!
Autoria: Beatriz Gomes – Professora do Jardim I
“Tenho medo(s), mas não sei como dizer isso!” Acolher é um começo… ou um caminho!
O primeiro dia, o primeiro passo, o primeiro olhar.
Para nós, um instante comum. Para a criança, um mundo inteiro a ser desvendado.
O coração bate forte, as mãos pequenas suam, os olhos procuram abrigo.
E o medo? Ah…O medo mora dentro do peito, escondido entre suspiros e abraços apertados.
Na infância, os medos nem sempre têm nome.
Às vezes, são apenas um choro contido, um silêncio denso, um corpo que hesita em atravessar a porta.
Medo de ficar. Medo de ser esquecido. Medo de não pertencer.
Como dizer isso, se as palavras ainda não aprenderam a alcançar o tamanho do sentir?
Acolher é escutar com os olhos, com o toque, com a alma.
É compreender que cada lágrima carrega um pedido de cuidado.
É estar ao lado sem apressar, dar tempo ao tempo, abrir os braços sem exigir um passo adiante.
É segurar sua mão sem pressa, estar por perto sem forçar, sussurrar com gestos:
– “Estou aqui. Você não está sozinho.”
Acolhimento é quando o colo é um porto e o olhar, um abrigo. É quando o ambiente se torna familiar, o cheiro da sala traz conforto, o som das vozes acalma o peito. A adaptação não é um instante, é um caminho. Um trajeto feito de pequenas conquistas e grandes afetos.
Para quem chega, tudo é novo. Para quem acolhe, tudo é possibilidade.
O medo se desfaz aos poucos na jornada que acalma:
– “Depois da história, já é a hora do bye-bye!”
Nos risos compartilhados.
Nas mãos que exploram e desvendam o espaço.
Nos pequenos rituais que dizem:
– “O dia começa, mas eu volto para te buscar.”
A adaptação acontece no instante em que a criança percebe que o afeto também mora ali. Que seu choro não é rejeitado, mas compreendido. Que seu medo não é fraqueza, mas um pedido silencioso de cuidado.
E assim, pouco a pouco, um novo mundo se abre. Os passos ganham firmeza, os olhos brilham de curiosidade, os abraços já não são de despedida e, sim, de reencontro. A voz que antes tremia se enche de histórias, e os pés que hesitavam, agora correm livres pelo espaço.
Porque acolher é o começo de tudo, o pontapé inicial, mas também é caminho, percurso, jornada.
E toda travessia feita com afeto encontra um porto seguro para ancorar.
Como disse Manoel de Barros:
“O olho vê, a lembrança revê, e a imaginação transvê.”
E quando a criança se sente segura, ela transvê o mundo com encantamento.
O que antes era medo se transforma em descoberta,
O que era silêncio se enche de palavras,
O que era hesitação se torna passo firme,
O que era desconhecido se torna casa.
E então, o novo se veste de familiar, o estranho se faz amigo, o espaço se torna pertencimento.
O adeus vira até logo, o receio se dissolve em riso.
Porque no acolhimento mora a coragem.
E na coragem, mora o voo.